terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Mensagem de Ano Novo


Aproxima-se mais um final de ano, ou seja cumpre-se mais uma volta nesta gigantesca e até algo épica jornada a 107.000 km/h ao longo de cerca de 1 bilião de quilómetros em torno do sol. É por este motivo que comecei a ligar a esta data desde a minha adolescência tornando-a de certa forma no único feriado religioso que tenho. Há algo de poético nisto de visualizar a nossa pequena e alheia esfera cruzando o vazio cósmico em torno do (relativamente) colossal Sol.

Isto leva-me à questão de que seria infinitamente mais cool se em vez de entrarmos no ano 2009, tendo como marco temporal aquilo que veio depois de Cristo, o que nem faz sentido em Estados que se dizem laicos, celebrássemos sim a entrada no ano 13.800.002.009, tendo como referência o inicio do Universo. Claro que, pelo menos actualmente, não é possível saber com exactidão a idade do Universo mas esta é uma ideia, que em abstracto, me entusiasma. Talvez um dia, quando/se as nossas sociedades mudarem muitos/alguns dos seus paradigmas se dê ao Tempo o seu real Tempo, aceitando aquilo que é a nossa história, a historia de tudo.

Noutra perspectiva, imaginando que uma qualquer civilização alien tem um especial fascínio por nós, calculo que seja com espanto e até alguma ternura que nos vêem ano após ano, volta após volta, a celebrarmos com métrica alegria cada translação da nossa terra. O José Cid ao vivo no Terreiro do Paço, os nossos céus fugazmente iluminados pelos fogos de artificio, a histeria de beijos, abraços e confettis, os corpos a jorrarem vómitos convulsos, tudo isto algures numa peça flutuante sobre o vácuo universal e perante o olhar incrédulo desses seres. Mas sinceramente, a bem da minha verdade, devo dizer que não creio que alguém esteja a olhar para nós, e ainda menos por nós. O Cosmos é para mim, até pela natureza da sua arquitectura, a alma e o corpo da solidão. De qualquer das formas, com ou sem espectadores, julgo que o fim de ano tem essa magia de demonstrar que aos poucos aprendemos o nosso lugar e que este mecanismo fantástico, embora lhe reconheça um forte carácter esclavagista e parasítico, a que chamamos de Vida, tem a real possibilidade de um dia se tornar inteligente.

Esta questão da inteligência e do reconhecimento cada vez mais vasto das nossas coordenadas espaço-temporais é um assunto que me desperta uma certa fixação, por inúmeros factores mas principalmente por acreditar que existe nele algo de intrinsecamente inconcebível. Ou seja, em absurdo julgo que existem respostas que mesmo que nos fossem dadas nunca seriam compreendidas. Por outro lado o “nosso” intelecto esforça-se por desbravar terreno rumo ao inconcebível, é essa a história mais nobre do homem, forçando a nossa maleável mente a aumentar o seu poder de computação chegando ao ponto de se criar computadores que cada vez mais se tornam o complemento de nós mesmos. Hoje discute-se a existência de hiper-dimensões, embora eu ache presunçoso e estranho que não se fale de hipo-dimensões, que até podiam “explicar” alguma coisa sobre a origem do Universo conhecido (mas eu nada sei, sou apenas um especulador), fala-se da natureza do tempo para além do seu cariz psicológico, descobriu-se a existência de matéria negra e discute-se a importância da mesma na mecânica do Universo, etc. Mas temos, neste momento, até a nível cognitivo, o nosso limite bem delineado, a Origem, e no fundo é aí que esbatemos desde que começámos a olhar para nós. Essa resposta, embora para mim, e julgo que para muitos, seja a mais aliciante é profundamente inconcebível. Pouco importa que resposta temos para nós próprios porque a questão da Origem aparenta ser redutível até ao infinito.

Existimos porque sim, não tem de existir um motivo mas poucos são os dias que não me questiono – Onde estou? Sei que vou morrer sem o saber, é a única coisa que me preocupa verdadeiramente na Morte, ter essa certeza que a ignorância é o que se segue à solidão. Não me mortifica por dentro a ideia mas acho uma falta de gosto não se saber onde estamos. Que local é este a que chamamos Universo, onde tentamos distinguir o Cosmos do Caos? O que existe agregado a ele, se existe? Porque simplesmente não existe o Nada em vez disto? A verdade é esta, talvez pela minha inclinação para as coisas do Diabo, a própria noção da existência de matéria perturba-me, a própria ideia do espaço e do tempo, em suma, a própria ideia da existência, porque o não existir é a ideia mais simples e lógica que imagino.

Bem... Sinto que me falta escrever muito (alias ainda tive que apagar um bloco de texto gigante), infinitamente provavelmente, mas aqui fica este estilhaço. É a minha mensagem de bom ano para todos e principalmente para mim, que bem mereço. Que à meia-noite de amanhã, mais coisa menos coisa, se lembrem de dar os parabéns ao Universo, esse absurdo que nos pariu. 


Um bom 13.800.002.009!!!

E que o Senhor vos ajude nas vossas desconstruções. :D

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

O infinito por detrás dos meus olhos




O sujeito da foto chama-se Daniel Tammet e é um savant, o que significa que consegue fazer coisas inimagináveis com o cérebro como aprender um idioma numa semana ou recitar os primeiros 22.500 algarismos de Pi, sem se enganar uma única vez. Segundo o próprio, não se trata somente de decorar números e letras, apesar de uma boa memória ajudar bastante nestas proezas, mas também e sobretudo de os visualizar em forma de imagens que se encadeiam harmoniosamente como paisagens em movimento (investiguem sinestesia se quiseram perceber melhor a ideia).

É claro que muitos factores contribuem para as extraordinárias capacidades deste savant e de outros como ele (entre os quais autismo e doenças neurológicas crónicas), mas não deixa de ser espantosa a quantidade de coisas maravilhosas e quase sobrenaturais de que o cérebro humano é capaz, entre as quais traduzir conceitos abstractos como cálculo e regras gramaticais em imagens ou sentimentos. Não deixa de ser espantoso também que o veículo dessa informação toda contida nas vossas caixas cranianas seja constituído por meros impulsos eléctricos e químicos. Tudo aquilo que já viveram, aprenderam ou imaginaram, todas as sensações, conceitos abstractos e factos estão ou podem vir a ser armazenados sob uma forma física. A percepção da cor azul, o sabor de nabos cozidos, a memória do primeiro dia de escola, aquele sentimento de desespero quando nos apercebemos que trancámos o carro com a chave lá dentro, tudo isso é modulado e codificado em pequenos impulsos eléctricos e químicos.

Hoje em dia já é possível utilizar implantes sob a forma de eléctrodos para ajudar cegos a ver e mudos a falar, ou melhor, para lhes transmitir e para receber impulsos que representam imagens ou sons. Embora sejam feitos extraordinários, estes avanços da neurologia são ainda muito embrionários mas creio que talvez um dia consigamos determinar a chave que nos permita descodificar essa linguagem de electrões (e hormonas), e manipulá-la a nosso bel-prazer, não só para ajudar pessoas com deficiências mas também para expansão recreativa/pedagógica das nossas percepções. Se tal acontecer, além de nos permitir experienciar coisas alheias ao nosso quotidiano (eu gostaria de saber o que sente um pára-quedista no primeiro segundo fora do avião, por exemplo, ou qual a sensação de compreender na totalidade equações diferenciais e coisas do género), talvez nos permita também descobrir impossibilidades maravilhosas - qual seria a sensação de atravessar esta dimensão espácio-temporal? E como será estar em vários sítios ao mesmo tempo?

Isto claro partindo do princípio que o cérebro humano tem capacidade de lidar com esse tipo de informação. Mas eu acredito que sim, basta saber falar com ele na linguagem certa e deixam de existir limites. Chegar a esse ponto é um questão de engenho e o resto depende unicamente da nossa vontade.